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Sociologist, Researcher (Ph.D.) Evaluation in European Funds

Não somos “A Cauda da Europa”

“Cauda” remete-nos para uma visão metafórica ou enfabulada da realidade: O cão que abana a cauda, obediente e subalterno face ao dono; o apêndice ou a periferia da Europa. Portugal e a sociedade portuguesa são representados deste modo em extensos domínios do saber, sem despertar qualquer contestação. Trata-se de uma ideia amplamente cultivada e arraigada nas nossas identidades. A nossa viagem na civilização e na modernidade teria assim naufragado e dado à costa. Ou à cauda. Ora, uma sociologia que se insurja contra a dominação deve estender a sua agenda, e combater uma subalternização discursiva que reifique um dado estado da auto-estima social e cultural do que significa nascer, viver ou passar por Portugal.

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Raiar

sopro de especiarias

eflúvio do teu corpo

peso da gravidade

no sombreado da carne



valva da alva vultosa

veios de cores mescladas

corpos de plasticina e ossos

acordes do sono



no descolar das pálpebras

mergulho num lago infinito

verde, água e mel

reluzem no lençol



sedas, veludos e tufos

sinais do elã

precipício do dia

Sopa de letras

sôfrega sopa

sem bálsamo nem vento

escorre na torrente do esófago

queimando as letras


corpo ácido

não te dilucido

sorvo-te tremendo

óleo hirsuto


primo as letras

titubo na sopa, e

aborto o corpo recôndito


massa seca no armário

disléxica, amarela e híspida

asfixia no plástico

memórias e um prato frio

Captura de ecrã 2015-11-2, às 15.36.16

Viagens de uma Vulva sem Cabeça

Origem 1

#Courbet_Parte_I

O pudor fez do pipi de Courbet o mais desejado do século XIX. Sem precedentes na história da arte, o pincel colocou-o no centro da tela, desprezando elementos apartados. Foi nomeado L’Origine du Monde (1866).

De felpudo porte, o pipi resultou de uma encomenda feita por Khalil-Bey, diplomata turco otomano que ansiava deter um nu de talhe cru, para juntar à sua coleção de janelas lascivas. Apesar da sua ousadia, trajou-o numa cortina, e escondeu-o no seu apartamento de Paris. Mas Khalil-Bey foi apenas o primeiro de vários falos sedentos. O pipi foi mais tarde adquirido por um antiquário, e silenciado por detrás de uma outra tela de Courbet. Já no século XX, passou pelas mãos de Émile Vial, cientista e colecionador de arte japonesa. Na primeira década de 1900, um barão e colecionador húngaro, de nome François de Hatvany, levou-o para Budapeste, onde foi usurpado pelo Exército Vermelho, durante a II Guerra Mundial. Mais tarde, o pipi foi retido na casa de campo de Jacques Lacan e após a morte do psicanalista, passou a ser propriedade do Estado francês. Lasso da longa viagem, chega em 1995 ao Musée d’Orsay onde é exposto publicamente, e cospe sobre os olhares mais castos.